O meu post de despedida, antes de ir para férias, era o anterior. Mas fui agora ver o hotmail do blog, que não via há tempos, e encontrei esta mensagem endereçada por António José Ferreira, o responsável pela magnifica Meloteca. O conteúdo é bem menos agradável do que o do podcast do Carlos, mas julgo que será, infelizmente, de interesse para os internautas melómanos que por aqui passam.
Fica aqui, reproduzido na íntegra:
MELOTECA EXCLUÍDA DE APOIOS
1. Em Setembro de 2003, foi lançada a Meloteca, sem pompa nem apoios. O projecto cresceu, foi reconhecido o seu interesse cultural, e a gestão do projecto tornou-se impossível de realizar cabalmente sem apoios institucionais. Muita informação tem ficado por divulgar por manifesta falta de tempo. Por essa razão, o Projecto foi em devido tempo candidatado aos apoios pontuais 2007 do Iartes.
2. A Direcção-Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular reconheceu "o manifesto interesse deste projecto enquanto suporte ao desenvolvimento das competências estéticas e artísticas", mas não o apoiou; o chefe da Casa Civil do Presidente da República considera que a Meloteca tem interesse mas não cumpre os critérios para obter o simbólico Alto Patrocínio do Senhor Presidente; a Fundação para a Computação Científica Nacional reconheceu ao Projecto "o maior interesse" e uma "qualidade notável", mas também não pôde apoiá-lo; o Instituto Camões considerou que se trata de uma iniciativa de "grande interesse no contexto da divulgação da música portuguesa", mas referiu que não se enquadra na sua missão fundamental.
3. Como a Meloteca e a minha vida profissional me ocupam quase todo o tempo, e eu não sabia quando seriam publicados os resultados, só em finais de Junho fui ver os resultados das candidaturas a apoios do Iartes. Como o projecto tem crescido de forma sustentada e é reconhecido por numerosos músicos de grande mérito, espantado fiquei quando vi que a Meloteca tinha sido pura e simplesmente excluída. Como dos motivos de exclusão do Manual de Procedimentos nenhum era aplicável, pedi uma explicação. Motivo da exclusão: apoios cumulativos. Que apoios cumulativos?
4. A Meloteca foi apoiada em 2006 com 1500 (!) euros pela Delegação Norte do Ministério da Cultura para o biénio 2006/2007. Todavia, 1500 euros é um apoio insignificante para os custos com ferramentas (software), cursos de Informática, computador e sua manutenção, electricidade, banda larga e servidor... No país que tanto investe na inovação, não há um sequer possibilidade de obter um computador portátil nem oportunidades para projectos deste tipo. Quem já têm formação qualificada e quer fazer melhor neste campo de novas tecnologias não tem oportunidades para melhor promover a cultura.
5. Há que referir que os 1500 euros são relativos ao biénio 2006/2007. Na prática, ter recebido 150 contos para o ano de 2007 impediu simplesmente que a candidatura fosse apreciada. Se a lei é essa, é uma lei cega e injusta, colocando em pé de igualdade apoios de 750 €, 7500 ou 20000, por exemplo. Obviamente, se o motivo aparecesse com clareza entre os motivos de exclusão, não teria perdido dias e dias a preparar a candidatura. No futuro, se candidatar a Meloteca ao apoio do MCNorte e obtiver um apoio, mesmo que simbólico, já não posso concorrer aos apoios do Iartes; mas se não concorrer, é ainda mais provável não receber qualquer apoio, nem de um lado nem de outro.
6. Há um colaborador da Meloteca que está neste momento a trabalhar voluntária e gratuitamente cerca de 3 horas por dia e a fazer viagens que paga do seu bolso. Sem apoios, como posso promover a formação permanente, técnica e específica de quem colabora no projecto e dar-lhe alguma compensação? Além das minhas ocupações profissionais, tenho dedicado ao projecto cerca de 1000 horas anuais. Não passarei a aplicar essas horas em trabalho remunerado nem deixarei de lado a Meloteca, porque ela é, para mim, mais do que uma profissão.
7. Enquanto se esbanja tanto dinheiro, se pagam milhões a gestores públicos e se indemnizam quando são substituídos sabe-se lá por que motivo, a cultura e a música continuam a alimentar-se das migalhas de banquete.
8. A Meloteca, livre e independente de subsídios, continuará a trabalhar pela qualidade da democracia no âmbito da música, a contribuir para que os músicos portugueses tenham mais oportunidades, a manifestar efectivo apreço pelas regiões de Portugal, a promover um pensamento musical português. Sem poder cumprir o projecto apresentado ao Iartes, a Meloteca continuará, apesar de tudo, a prestar um serviço público e a colmatar lacunas na Música, na Cultura e na Educação.
António José Ferreira