Há concertos que te levam de volta à segurança do amor primeiro, ao momento em que decidiste que a vida sem música não era vida, embora parecesse que podia ser vivida. Que se lembram indefinidamente e que tiram a vontade de regressar tão cedo a uma sala de concerto, porque tens a certeza de que irás ser desiludida.
Riccardo Muti e a Philharmonia Orchestra deram esta semana um concerto assim. Foi na passada segunda feira, no Auditorio Nacional de Madrid. Tivemos uma sinfonia nº 35 de Mozart "clássica", alla Karl Böhm; o poema sinfónico Les Preludes, de Liszt, transformado em puro jogo de sonoridades; e, por fim, a Sexta de Tchaikovsky.
Muti é um dos melhores intérpretes da música do compositor russo. A "Patética" acompanha-o há anos. Rotina, porém, não é palavra que entre no seu vocabulário. Torna-a numa jóia de som, polida com precisão nas suas múltiplas texturas e facetas e com a sua subtil estrutura à mostra. Tenho a impressão de que os músicos não falharam nem uma das cambiantes indicações de dinâmica com que Tchaikovsky encheu a sua partitura. Mas Muti também encara Tchaikovsky como o compositor moderno, corruptor dos nervos, que foi. Ou seja, sem visos de patetismo pedante. O incrível é que, na escuta, torna possível que a contemplação fascinada e a "concentração para dentro" surjam em simultâneo.