1/30/2005

Berta Alves de Sousa por Janete Ruiz, ou há razões para ser feminista?

Foi defendida na passada quarta feira, na Universidade de Coimbra, a dissertação de mestrado da autoria de Janete Ruiz dedicada à pianista, compositora e crítica musical portuense Berta Alves de Sousa. Foi orientada pela Professora Luísa Cymbron, tendo sido eu própria quem teve a honra (e o prazer) de fazer as vezes de arguente principal na prova.

Como podem imaginar, a questão da «mulher» na música erudita durante o século XX foi um dos eixos da discussão, em grande medida suportado na própria tese que começa com um enquadramento do tema. A tese tem muitas qualidades (obteve, aliás, a nota máxima, Muito Bom, por unanimidade), mas julgo - tal como disse na prova pública - que perdeu, em certa medida, a oportunidade de explorar de forma um pouco mais aprofundada as relações entre feminismo e musicologia, que são bastante menos radicais e provocatórias do que a ligação de ambos os termos num só sintagma poderia fazer pensar. A já Mestre Janete Ruiz, que se defendeu com pertinência e habilidade, afirmou, porém, num dado momento que ela não se considerava feminista e que, por isso, não tinha sentido a necessidade de se apoiar nessa tendência da musicologia.

Fiquei depois a pensar que se uma tese dedicada, por exemplo, a Lopes-Graça, começasse por traçar um panorama geral, baseado em números, do ensino artístico e da prática artística em Portugal, o compositor pareceria nesse contexto, sendo homem, quase tão «excepcional» como parece ser Berta Alves de Sousa pelo facto de se ter dedicado profissionalmente à música sendo mulher. O plano se colocaria então na questão da fraqueza da profissionalização musical em Portugal, o que nos levaria bastante longe e apagaria, ou pelo menos remeteria para um segundo plano, a pertinência de pensar a partir da categoria de género.

Mas casualmente, nesse mesmo dia, quando regressava a Lisboa, deparei-me com este artigo. Admito que, à partida, estava predisposta a concordar com a autora porque, desde que, há alguns anos, li um artigo no qual Miguel Sousa Tavares se queixava de forma amargurada e pateta pelo elevado número de mulheres presente nas redacções dos jornais e revistas portugueses, nunca mais voltei a pôr os meus femininos olhos sobre a sua prosa (uma é assim de radical... e tem outras coisas mais interessantes para ler). Deixando este pormenor de lado, o que mais me admirou e apreciei do texto de Madalena Barbosa foi a clareza dos argumentos e uma certa pedagogia que é raro encontrar aplicada a um assunto como este, por vezes perigosamente tendente para a demagogia.