Estreia hoje, no Grande Auditório da Fundação Calouste Gulbenkian, de Hovering Over, de Luís Tinoco, um dos meus compositores preferidos desde que, em 1995, escutei a primeira obra do seu catálogo: um quarteto que foi então distinguido com o Prémio Lopes-Graça de Composição, promovido anualmente pela Câmara Municipal de Cascais.
Nestes dez anos (ai!), o compositor tem desenvolvido um sério e individual percurso criativo, cujos sólidos alicerces fazem pressagiar uma carreira com projecção internacional. As palavras da regente Susanna Mälkki (quem irá dirigir esta primeira audição), citadas pela Cristina Fernandes no PÚBLICO, ficam-lhe aliás que nem uma luva: «Para os novos é mais fácil o cruzamento com diferentes culturas, géneros e estilos. Cresceram com a música pop, com os media. Os jovens compositores são mais realistas e menos snobs do que os da antiga geração.»
O comentario de Tinoco relativamente a Hovering Over, retirado do programa do concerto, é lacónico:
«O estatismo o imobilidade sugeridos pelo título são mais claros nos extremos da
peça, embora esta seja apenas uma percepção condicionada pela densidade rítmica
das secções centrais. No entanto, se nos concentrarmos no plano harmónico - o
verdadeiro ADN de Hovering Over e cuja importância surge afirmada logo no gesto
inicial -, conclui-se que a quase totalidade da peça é construída pairando
sobre o mesmo tipo, ou família, de acordes.»
O texto contém, porém, elementos constantes na maioria das suas obras: por um lado, a importância que têm a visualidade e a ilusão do espaço na concepção das suas obras, sobretudo como fundamento para a percepção (importância dada ao título, estatismo / imobilidade como possíveis elementos definidores da estrutura, a escuta determinada pela construção "pairando sobre" - mais uma referência de carácter espacial - um mesmo tipo de acordes); por outro lado, a intenção de criar peças, por assim dizer, completas e coesas mediante o recurso a processos "internos", nomeadamente a harmonia, que é a ferramenta por ele usada para agarrar o ouvinte, introduzindo-o num espaço sonoro repleto de acontecimentos que nao são meros efeitos e que, embora possam estar em planos sobrepostos, não ficam "perdidos" na superfície.
Mas o melhor, como sempre, será ir às 19h à Fundação para escutar o magnífico Birmingham Contemporary Music Group sob a batuta de Susanna Mälkki, tocando, em estreia, a obra de Tinoco e mais uma peça de Stuart MacRae, e ainda, em primeira audição portuguesa, composições de David Sawer, Harrison Birtwistle e do genial Thomas Adès.