Parecem-me um pouco simplistas as leituras feitas dos comentários meus e do João (do óptimo Ópera e demais interesses) publicadas como comentários no anterior post. No que me diz respeito, surpreende-me sobretudo que nem o António nem o Sérgio se tenham dado o trabalho de perguntar as razões pelas quais eu citei o Richard Sennett num post que, ainda, falava do último ensaio do José Gil publicado em Portugal e não, de todo, sobre a situação da música contemporânea em Portugal. Inclusivemente o título foi retirado de um dos ensaios do Sennett. Ainda, até choca ter de lembrar que uma coisa é o fenómeno “real” e outra o discurso teórico e que é possível – estúpida complicação, não é? – haver um discurso sobre o próprio discurso...
Da realidade musical portuguesa, e das suas fortalezas e fraquezas, tenho falado e escrito alguma coisa e – tenho essa esperança secreta – digo eu que ninguém irá pensar seriamente que o meu bálsamo de Fierabrás para os "seus problemas" seja a musicoterapia. Não tenho escrito tanto sobre o que acontece em Espanha, mas posso assegurar que escutar Lola Flores (ou Plácido Domingo, tanto faz) não é uma solução para as carências que aqui também existem, sobretudo ligadas à divulgação da música mais recente (“espanhola” e não só).
Mesmo assim, se do que se trata é de comentar as circunstâncias adversas nas quais os compositores portugueses desenvolvem a sua actividade, posso constatar o óbvio (as estruturas inexistentes, referidas tanto pelo Sérgio como pelo António) e insistir em ideias que já tenho exposto num dos primeiros posts deste blogue (intitulado “Consonâncias”, e que fui buscar ao baú porque julguei que tinha algum interesse). Não me parece, porém, que as críticas ao “star system” que já têm dois séculos de existência (em Paris, por exemplo, na primeira metade do século XIX já encontramos artigos jornalísticos com queixas desse teor) levem muito longe. Também não acho que misturar Estado e Sociedade Civil seja demasiadamente produtivo – não, definitivamente não é produtivo e, ainda por cima, é mistificador.
Não há um centro de documentação musical? Não há editoras? Não há etiquetas discográficas? É muito certo. E, para reforçar a denúncia dos compositores, aproveito para afirmar com veemência – junto com o meu caro ex-colega na Universidade de Évora, João Pedro Alvarenga, do sempre interessante Musicoblogo – que os universitários especializados no estudo da música portuguesa também nos queixamos do mesmo.
No entanto, também é certo que eu, na minha qualidade de musicólogaterapeuta, sempre posso ressolver os meus problemas escutando (ou melhor, lendo a partitura com cortes que há na BNL, porque não existe em gravação) a primeira das Sinfonias Camonianas de Rui Coelho: ele, seguindo Teófilo Braga, também se queixa aí amarguradamente da cruel raça lusitana, que nem o génio de Camões foi capaz de reconhecer.